Entrevista: Camila Ferrara – a biologia e a força da ciência

Camila Ferrara é médica veterinária formada pela Universidade de Santo Amaro, em São Paulo, e mestre e doutora em Biologia de Água Doce pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia.

Desde 2004 atua na Amazônia, estudando a biologia e a ecologia dos quelônios amazônicos.

Atualmente, seu foco está na reprodução, comunicação e conservação, especialmente da família Podocnemididae.

Ferrara teve o diagnóstico de hérnia de disco, e conta como foi penoso conviver com essa dor e como isso afetou seu trabalho e seu dia a dia. Nesta entrevista, ela conta um pouco de como é sua rotina como pesquisadora e cientista, suas dores e sua recuperação.

Conte-nos um pouco sobre a beleza do trabalho, o dia a dia de pesquisa com os quelônios. Qual a maior beleza deles na sua opinião e o que te atraiu para esse campo? Como é, em resumo, sua rotina diária profissional?

Há pouco mais de 20 anos eu, como estudante de veterinária e um encanto especial por animais silvestres, decidi vim fazer estágio na Amazônia com peixe-boi. Quando cheguei, fiquei encantada com tudo que via e vivia. Acredito que foi a partir daí que a primeira sementinha foi plantada…Como diz um ditado popular por aqui, “quem come jaraqui (uma espécie de peixe) não sai daqui” e sem dúvida nenhuma eu comi jaraqui (ri).

Depois de formada fui morar do outro lado do mundo, voltei, morei em Belém, mas foi em Manaus, no estado do Amazonas, que encontrei meu caminho. Quando cheguei em Manaus, fui imediatamente trabalhar com um dos maiores pesquisadores de tartaruga do mundo, Dr. Richard C Vogt, mais conhecido como Dick. Dick foi o meu grande mentor. Com ele eu fiz meu mestrado, doutorado e comecei a aprender a surfar na onda da pesquisa e conservação das tartarugas da Amazônia.

Durante meu doutorado, descobri algo inédito para a ciência. Descobri que as tartarugas se comunicam por som desde a fase embrionária, ou seja, poucas horas antes de sair do ovo os filhotes já começam a se comunicar. Neste trabalho, também conseguimos provar o cuidado parental, mostrando que as mamães tartarugas aguardam seus filhotes nascerem para migrarem juntos da praia de desova até a floresta alagada, onde terão comida e proteção durante boa parte do ano.

Atualmente, trabalho na Wildlife Conservation Socity – WCS Brasil, uma ONG internacional com sede na cidade de Manaus. Na WCS, minha missão é a conservação das tartarugas da Amazônia, uma vez que estes animais são muito consumidos na região norte do país. Atualmente, somente no estado do Amazonas, mais de 1.7 milhões de tartarugas são consumidas por ano. Somente na cidade de Manaus, 90 tartarugas são consumidas por hora todos os dias do ano.

Durante meu dia a dia, fico dividida entre o trabalho na cidade e no campo. Na cidade busco por aprovação de projetos, coordeno uma campanha de sensibilização contra o consumo de quelônios, analiso dados, escrevo relatórios, tenho alunos, entre outros. No campo é onde desenvolvo meus projetos de pesquisa e conservação das tartarugas da Amazônia.

O que mais me encanta no meu trabalho é estar em campo trabalhando em prol da pesquisa e conservação dos quelônios em especial da tartaruga-da-amazônia. Além ter a certeza de que estou contribuindo para um país mais cheio de bem-estar, com o verde da floresta e a presença dos animais.

Como começaram as dores e como elas dificultavam seu trabalho? Elas foram aumentando com o tempo e em que velocidade? E em que momento você achou que era inadiável procurar ajuda médica?

Eu comecei a sentir dor em novembro de 2021, mas foi no final de janeiro de 2022 que eu fui buscar ajuda médica em Manaus. Entre o final de janeiro até final de março, quando fiz minha cirurgia, a dor veio piorando com uma certa velocidade. No final de janeiro eu parei de correr, mas ainda me sentava com um pouco de incomodo. No início de março eu já não conseguia mais me sentar, só dormia de lado e não podia mais dirigir. No meio de março eu descobri o Dr. Douglas, entrei imediatamente em contato com ele e logo me identifiquei com o diagnóstico e com a recomendação cirúrgica. Em menos de uma semana estava em São Paulo operando minha coluna e voltando a andar. No dia seguinte da cirurgia, eu quase não acreditava como era bom não mais sentir aquela dor que tanto tirou minhas noites de sono. Definitivamente fazer a cirurgia foi a minha melhor opção.

Antes de optar pela operação, você passou por tratamento clínico, com remédios?

Sim, eu tentei durante dois meses usar remédios.

Seu trabalho de campo parece exigir minimamente de seu corpo. Você faz alguma atividade física regular? Qual sua maior preocupação com a saúde do seu corpo em relação à sua prática profissional?

Sempre fui uma pessoa bastante ativa, e nos últimos anos vinha treinando natação e corrida, mesmo assim meu corpo não aguentou. Hoje, após quase seis meses de cirurgia, eu já voltei a correr, nadar e acrescentei aos meus treinos a musculação para tentar garantir não reviver a hérnia de novo e para manter meu corpo fortalecido para prevenir problemas futuros. Além dos exercícios, eu também me preocupo com minha alimentação, evitando determinados tipos de alimento no meu dia a dia, como o açúcar e o trigo especialmente.

Após a operação, você sentiu uma melhora para desempenhar sua ciência? Descreva como melhorou.

Após a operação, imediatamente eu senti uma melhora não só para trabalhar como para tudo na vida. A melhora foi instantânea, impressionante. Além disso, meu processo de recuperação, especialmente nos três primeiros meses, foi ótimo, sem sofrimento. Em 4 semanas já estava na piscina nadando normalmente.

Camas, colchões, dores nas costas e a paz mundial

“Fomos de Paris para o Amsterdam Hilton / Conversando em nossas camas por uma semana / O pessoal da imprensa perguntou: O que vocês fazem na cama? / Eu disse: Nós só queremos ter um pouco de paz”.

A insuperável música dos Beatles “The Ballad Of John And Yoko” fala sobre uma passagem estranha e inesquecível na vida de John Lennon e sua (naquele momento) recente esposa Yoko Ono, em 1969: uma semana numa cama de hotel em Amsterdã, Holanda, lutando pela paz.

Eles se conheceram em 1966, quando Lennon ainda era casado com Cynthia Powell (mãe do também músico Julian Lennon). John e Yoko ficaram juntos mesmo assim e, por problemas burocráticos e com o crescente ódio dos fãs, se casaram em Gibraltar, território espanhol: “Finalmente pegamos o avião para Paris / Lua-de-mel junto ao Sena / Peter Brown ligou para dizer: Vocês podem dar um jeito / Vocês podem se casar em Gibraltar, perto da Espanha”, diz a música. Era 20 de março de 1969.

O casal decidiu passar a lua-de-mel no Hotel Hilton, em Amsterdã, mais especificamente na cama do quarto 702, onde iniciaram um protesto pacífico contra a Guerra do Vietnã. A imprensa teve livre acesso ao quarto, para fotografar o casal mais famoso do mundo, no episódio que ficou conhecido mundialmente como “Bed-in”.

Esse é um dos episódios mais conhecidos da música, e um dos protestos mais inusitados da história. Como assim ficar uma semana na cama?
A Guerra do Vietnã não terminou por isso, mas o recado foi dado, a controvérsia foi feita e até mesmo uma música, a deliciosa já citada “The Ballad Of John And Yoko”.

Que eu saiba, muita coisa foi perguntada ao casal, mas eu teria feito uma única pergunta, igualmente inusitada: “uma semana na cama… as costas de vocês não estão doendo?”.

Relação colchão e dor nas costas

John Lennon e Yoko Ono não ficaram uma semana deitados, como mostram as fotos e as imagens captadas naquele momento. Na maioria das vezes estavam sentados, mas dor nas costas e colchão não formam uma relação incomum.

Essa é uma dúvida que geralmente as pessoas têm: a relação entre dor nas costas e colchão. Muitas vezes, os pacientes se queixam de dores nas costas ao acordar, que vão aliviando durante o dia, mas retornam na manhã seguinte ao acordar.

Alguns estudos foram feitos nessa área, mas os artigos na literatura são insuficientes. Portanto, o que posso indicar é que, talvez, valha a pena buscar um colchão nem tão macio e nem tão firme, que sustente o peso do seu corpo de maneira adequada.

Independentemente de marca, o seu colchão vai desgastar e deformar conforme o tempo. E quando isso acontecer, será o momento de substituí-lo!

Outros fatores

Outros fatores que podem ter relação com a dor nas costas matinal são a má qualidade do sono (movimentos noturnos e má posição ao adormecer), sedentarismo e alimentação rica em carboidratos ultraprocessados, que pode gerar reações inflamatórias nas articulações, tendões e músculos, podendo ser percebidas como dores no início dos movimentos.

Vale lembrar que há neurologistas e/ou otorrinolaringologistas especializados em sono; portanto, se preciso for, busque um especialista no assunto!

Não é fácil

Ninguém gosta de viver com dor. Isso é fato – tanto quanto a maioria das pessoas é contra a guerra e a favor da paz.

Como cantou John Lennon e seus Beatles, “Caramba, você sabe que não é fácil / Você sabe como pode ser difícil / Do jeito que as coisas estão indo / Vão é me crucificar”. Lutar pela paz nunca é fácil. Mas lutar pelo pão de cada dia também não é. Por isso, é preciso dormir um sono reconfortante e restaurador das energias. Sem isso, nossa produção pode ser afetada e certamente a saúde será abalada.

O colchão e os travesseiros (o sono!) são ferramentas importantíssimas na nossa vida. Procure um ideal para você. Suas costas agradecem.

Mas se mesmo assim as costas continuarem a doer, procure um especialista para te orientar sobre o que fazer e vamos declarar uma duradoura e merecida paz com as nossas costas.

Dor no ombro? Não dê de ombros!

A Internet é algo que surpreende diariamente, uma cultura à parte, especialmente o convívio das redes sociais. Descobri há pouco os kaomojis, simbologias divertidas para representar emoções, expressões, situações, animais e outras variedades que queremos comunicar. Não é algo novo e há uma infinidade de alternativas de símbolos construídos com elementos dos teclados. Como nos ensina este site, os kaomojis são uma variação dos emoticons, “ícones emocionais usados para compensar a incapacidade de transmitir inflexões de voz, expressões faciais e gestos corporais na comunicação escrita”.

“No Japão, os emoticons são amplamente usados em mensagens de texto em celulares, e-mails e redes sociais e levam o nome de emoji ou kaomoji (颜 文字 /かお も じ), que literalmente significa: ‘kao’ = face, ‘moji’ = caractere)”, ensina.

“Apesar dos emoticons serem usados em todo o mundo, o kaomoji difere-se por algumas combinações serem bem complexas, devido ao uso de caracteres de bytes duplos. Como representam expressões faciais, eles acabam sendo muito úteis para demonstrar os sentimentos de quem está digitando a mensagem (⁀ ᗢ ⁀)”, segue.

Alguns se tornaram bastante conhecidos e certamente nos últimos anos (na última década! Como o tempo passa rápido!) você se deparou com ele: o “smugshrug”, representado por ¯\_(ツ)_/¯.

“Smugshrug” é uma expressão em inglês que significa “dar de ombros”. É como se alguém dissesse “e daí?”, “e eu com isso?”, “tô nem aí”, “paciência, fazer o quê?” etc.

Ela se popularizou nas redes sociais e é um jeito bem fofo e engraçadinho de confrontar o interlocutor. Hoje, o Whatsapp tem emojis específicos para cada expressão, inclusive o “smugshrug”, de modo que as versões kaomojis, ao menos no Brasil, correm o risco de sumir.

“E eu com isso?”, poderá perguntar o leitor.

Pois bem. A expressão “dar de ombros”, com emojis, kaomojis ou letras usuais, seguirá viva, não importa o rumo que a comunicação humana terá. E junto com a pergunta “e eu com isso?”, nós, latinos, carregamos junto um gestual, levantando os ombros e pendendo a cabeça para o lado. E é aí que queremos chegar.

Nossos ombros

Tal como os joelhos, os nossos ombros são articulações bastante complexas, que unem o úmero, omoplata (escápula) e clavícula. São duas articulações: a gleno-umeral e a acromioclavicular.

Mas, fora dos termos médicos, o que precisamos saber é que o ombro é tido como a articulação mais flexível de todo o corpo humano, permitindo que nossos braços façam movimentos giratórios inimagináveis. Enquanto os joelhos se encarregam de sustentar e aguentar nosso peso e nossos movimentos, os ombros se encarregam de articular as necessidades de movimento e peso que os braços intencionam.

E todo esse esforço constante e diário faz, claro, os ombros sofrerem. Uma hora isso pode acontecer.

Dores

A maioria das queixas de ombro estão relacionadas à dor, sobretudo à noite. Essa dor pode ser espontânea, após atividades ou esforços físicos, ou após alterações da saúde em geral.

Além de dor, algumas patologias do ombro podem diminuir ou limitar os movimentos, sobretudo os de elevar e/ou rodar o braço (apanhar roupas num varal ou alcançar as costas, respectivamente e por exemplo).

Portanto, é comum sentir dor nos ombros nessas situações, mas se a dor é contínua, se mantendo por dias ou até mesmo piorando com o passar do tempo, é recomendado buscar um ortopedista para uma investigação mais aprofundada da causa da dor.

E daí?

Essa pergunta nunca poderá ser feita após a primeira dor no ombro. Não é possível “deixar para lá”, porque pode agravar o problema, com o passar do tempo, com a repetição de movimentos. Consultar seu ortopedista é essencial para identificar o problema, a causa e, assim, poder desenvolver um tratamento – e acredite é provável existir um tratamento.

Nosso corpo é uma máquina (perdoe-me pelo clichê) e ela precisa constantemente de calibragem, cuidados e melhorias. Ao primeiro sinal de dor nos ombros ou nos joelhos, vá ao médico. Não dê de ombros. Deixe o ¯\_(ツ)_/¯ para assuntos cotidianos.

Joelho: muitas opções de tratamento

Talvez os mais novos não lembrem, mas Zico, o grande jogador do Flamengo e da Seleção Brasileira (e que depois virou um treinador de sucesso no Japão), foi nossa grande esperança nas Copas de 1982 e 1986, com o inigualável Telê Santana de técnico.

Em 1982, na chamada “Tragédia do Sarriá”, o Brasil perdeu de 3 a 2 pra Itália, três gols do falecido Paolo Rossi, quando precisava só de um empate. Era um timaço aquele Brasil e a eliminação foi uma catástrofe nacional. Mas logo viria 1986 e aquela geração poderia colocar fim ao jejum que vinha desde 1970.

Mas em 29 de agosto de 1985, no Maracanã, quando Márcio Nunes, zagueiro do Bangu, deu uma entrada desleal em Zico, tudo mudou. O zagueiro arrebentou o joelho do maior craque daquela geração cheia de craques.

O Galinho de Quintino se viu com uma “torção no joelho direito”, segundo a imprensa da época. O craque flamenguista teve de operar o joelho. Ele foi para aquela Copa do Mundo, no México, em 1986, sem condições ideais e acabou perdendo um pênalti decisivo contra a França. Brasil fora e o sonho do tetra, adiado (até 1994, como hoje a gente sabe bem).

Joelhos e joelhos

Cada caso é um caso. Não é preciso ser atleta profissional para ter lesões graves como a do nosso craque Zico. Inclusive, a época era outra e hoje, talvez, Zico tivesse melhores condições de recuperação.

O joelho, como se sabe, é uma articulação sinovial bastante complexa, com patela, menisco, ligamentos, cartilagens… A sua função de sustentação do peso do corpo, de articulação, movimentação e flexibilidade impõe muitas obrigações à estrutura, que com o passar do tempo ou com o estresse de determinadas atividades pode, sim, desgastá-la.

Mas tal evolução para desgastes ou avarias por impactos dependem de cada caso. O fato é que o tratamento para o joelho pode se dar com algumas opções.

Caminhos a seguir

Nos casos de degenerações, inflamações ou algumas entorses, o tratamento conservador é a primeira opção. Mas, em alguns casos, as infiltrações articulares, ou periarticulares com corticoides, ácido hialurônico ou, mais modernamente, ortobiológicos, o plasma rico em plaquetas (link) e o aspirado de medula óssea podem trazer alívio e reparação do tecido lesionado.

Também podemos utilizar os bloqueios de nervos da articulação como adjuvantes para alívio da dor, proporcionando conforto e segurança ao paciente, para imersão em um programa de reabilitação articular através de exercícios de fortalecimento, alongamento e ganho de propriocepção, dependendo de cada caso.

Uma opção de tratamento interessante nos casos de artrose dos joelhos nos idosos é a técnica de neuromodulação dos nervos geniculares: de maneira pouco invasiva, é possível obter alívio da dor e rápida recuperação do paciente, podendo mesmo evitar uma cirurgia convencional.

Gol de placa

Como se vê, as opções são muitas, mas todas elas dependem de rigorosa avaliação do seu médico ortopedista. Mais uma vez, cada caso é um caso. As variantes são muitas.

Joaquim Grava, membro titular da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia, anos depois relembrou ao canal SporTV a difícil recuperação do atleta: “Zico teve uma lesão de ligamento cruzado anterior e ligamento colateral. Na época em que o Zico foi operado, ainda não tínhamos desenvolvido a cirurgia da reconstrução do ligamento cruzado anterior. Era muito difícil, você ficava três meses de gesso, aí você tirava o gesso, fazia uma recuperação lenta, era tempo de um ano e meio, dois anos”.

Hoje, a recuperação é um passo importante, com protocolos que ajudam a melhorar essa fase. Sorte nossa que a medicina evoluiu. O nosso gol de placa é a perseverança de médicos, pesquisadores, estudiosos, cientistas e, claro, pacientes, que se dedicam em todo o processo. Se o joelho tem algum problema, a medicina pode te ajudar. Daí, quem sabe, você poderá comemorar pulando euforicamente o próximo título mundial do Brasil.